Controlada por familiares de vereador, Rádio Biguaçu está sob suspeita de irregularidades

Matéria do Jornal Notícias do Dia denuncia atuação irregular de Rádio Comunitária.

20/05/2014

Conhecida na região como a “rádio do Braz”, a Biguaçu FM (98.3 MHz) sofre influência política e familiar do vereador José Braz da Silveira (PSDB). Desde sua criação, em março de 1998, a Abracom (Associação Biguaçuense de Radiodifusão Comunitária), mantenedora da emissora, tem pelo menos um integrante da família do político na diretoria da entidade.

Sua mulher, Eliana Maria Pereira Silveira, era vice-presidente na ata de fundação, passou a ser secretária da entidade em 2008 e foi eleita presidente em 2011. A filha de Braz da Silveira, Eliana Maria Pereira da Silveira, é tesoureira da associação desde 2008. Ambas foram recolocadas nos mesmos cargos até janeiro de 2017 em assembleia realizada em janeiro deste ano, com a participação de apenas 23 associados.

Sirlei Aparecida Massing também foi reconduzida na mesma reunião ao cargo de presidente do Conselho Fiscal. Como mostrou o ND na última sexta-feira, Sirlei integra o grupo de três assessores flagrados pela reportagem fora da Câmara de Vereadores durante o expediente. Ela é lotada no gabinete do vereador do PSDB, que tem um escritório de advocacia no mesmo prédio onde está a rádio. Sirlei foi flagrada na emissora em vez de cumprir expediente no legislativo local.

Desde 2010, a Câmara já pagou mais de R$ 75 mil para que a emissora transmita ao vivo as suas sessões deliberativas, segundo dados do portal da transparência do Legislativo. O valor mensal do repasse é atualmente de R$ 2 mil. Emissoras comunitárias podem ter apoio cultural de órgãos públicos desde que respeitem a lei de licitações. Mas a lei federal 9.612/98, que regula o funcionamento deste tipo de emissora, proíbe vínculos que “subordinem ou a sujeitem à gerência, à administração, ao domínio, ao comando ou à orientação de qualquer outra entidade, mediante compromissos ou relações financeiras, religiosas, familiares, político-partidárias ou comerciais”. É o que diz o artigo 11o da lei federal.

Acaert pedirá fechamento do veículo de comunicação

Por ter controle político e familiar por parte do vereador José Braz da Silveira e também veicular anúncios comerciais durante sua programação, a Acaert (Associação Catarinense de Emissoras de Rádio e Televisão) pedirá, ainda nesta, semana o fechamento da rádio Biguaçu FM em denúncia ao Ministério das Comunicações e à Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações).

Segundo a assessoria jurídica da Acaert, a emissora não poderia veicular anúncios na rádio e no seu site pelo que prevê a legislação federal. Desde o começo de 2014, a Acaert já ajuizou mais de 60 ações contra rádios comunitárias irregulares na Justiça Federal e deve fazer o mesmo sobre a emissora de Biguaçu. A associação também informa que fará uma medição do sinal que não pode ultrapassar 1 km do local de instalação da antena de transmissão.

Apesar de não fazer parte da diretoria da Abracom, José Braz da Silveira assina, como diretor cultural, o texto de apresentação da emissora na internet e também já publicou o artigo “O papel das rádios comunitárias na comunicação social”, como presidente da Associação, no site do Instituto Caros Ouvintes. Para João Carlos Santin, que representa a Abraço (Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária) em Santa Catarina, rádios comunitárias precisam estar abertas à participação popular e de entidades de classe da comunidade. “O que não pode é ser controlada por um grupo político ou familiar. É por essa razão que essa rádio não está entre as associadas da Abraço”, afirma Santin.

O ND tentou contato por telefone com a presidente da Abracom na sede da rádio, mas foi informado que ela poderia ser encontrada no escritório do vereador, no térreo do mesmo prédio comercial. O vereador também foi procurado pela reportagem, mas, até o fechamento desta edição, não deu retorno sobre os pedidos de esclarecimentos.

Controle político no Estado

No trabalho “Política e Religião nas rádios Comunitárias em Santa Catarina”, apresentado ainda em 2003 no Congresso Anual em Ciência da Comunicação, os pesquisadores Jacques Mick e Fabiana Vieira mostraram que três quartos das emissoras comunitárias em Santa Catarina tinham ou tiveram vínculos estreitos com líderes políticos ou personalidades religiosas.

Com dados obtidos por questionários enviados a todas as rádios, além de entrevistas com líderes locais, foi possível constatar que das 32 rádios comunitárias em funcionamento naquele ano, 14 estavam nas mãos de políticos, têm algum integrante político como apoiador ou membro das associações, e 10 são presididas por líderes religiosos. Somente cinco emissoras afirmaram, segundo a pesquisa, não ter nenhum tipo de vínculo, seja político ou religioso.

 

Repórter: Reportagem - Jornal Notícias do Dia - 20/05/14

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