STF decide que imprensa pode ser responsabilizada por fala de entrevistado
A punição se dará somente em casos de "indícios concretos de falsidade"
29/11/2023
O plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) fixou uma tese
hoje (29) que estabelece critérios em que veículos de imprensa podem ser
responsabilizados por declarações de entrevistados que imputam falsamente crimes
a terceiros. A punição se dará somente em casos de "indícios
concretos de falsidade" da imputação ou se o veículo deixou de observar o
"dever de cuidado" na verificação dos fatos e na divulgação de tais
indícios.
Entenda o caso:
O STF discutiu um pedido de indenização do ex-deputado
Ricardo Zarattini Filho, que já morreu, contra o jornal Diário de Pernambuco
por uma entrevista publicada em 1995. Em agosto, nove ministros mantiveram a condenação do jornal,
mas o STF não chegou a formar uma tese devido a divergências entre os
magistrados.
Hoje, o ministro Alexandre de Moraes, um dos votos pela
condenação, sugeriu uma proposta que foi acatada pelos demais. A proposta afirma que a liberdade de imprensa veda a censura
prévia, mas permite a responsabilidade dos veículos de imprensa por
"informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas,
mentirosas". Tais conteúdos podem ser removidos - este trecho foi sugerido
pelo ministro Cristiano Zanin e aprovado pelos demais ministros.
No caso do veículo que publicar uma declaração de
entrevistado que imputa falsamente a prática de crime por terceiro, a empresa
poderá ser responsabilizada somente em dois cenários:
- Se "houver indícios concretos de falsidade da
imputação" na época da publicação;
- Se o veículo "deixou de observar o dever de cuidado
na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais
indícios".
A tese foi fixada a partir do caso envolvendo o Diário de
Pernambuco. Em 1995, o veículo divulgou entrevista com o delegado Wandenkolk
Wanderley, também já morto, que acusou Ricardo Zarattini Filho de participar do
atentado a bomba no Aeroporto dos Guararapes, em Recife, em 1966, durante a
ditadura militar.
A defesa de Zarattini Filho afirmou que a acusação não era
verdadeira e cobrou indenização do veículo. O pedido foi julgado procedente
pelo STJ, e subiu ao Supremo por um recurso do Diário de Pernambuco.
Ontem (28), sete entidades ligadas ao jornalismo, como a
Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e o Instituto
Vladimir Herzog, divulgaram uma nota conjunta demonstrando preocupação com a
discussão no Supremo.
No texto, as associações afirmam que as entrevistas são um
"elemento fundamental para o exercício jornalístico" e que casos
históricos, como as declarações de Pedro Collor ou Roberto Jefferson, no
Mensalão, tiveram impactos no rumo do país.
As entidades afirmam que uma tese poderia ter
"consequências enormes em termos de autocensura e para a veiculação de
informações que servem ao interesse público".
"E se é verdade que entrevistados podem dar declarações
polêmicas e até questionáveis a meios de comunicação, muitas vezes as próprias
declarações viram notícia, especialmente se envolvem figuras públicas",
dizem as entidades.